Licitação do Sistema de Bilhetagem Digital é uma caixa de Pandora

A situação dos transportes no município do Rio parece uma cartola da qual não saem coelhos, mas bichos estranhos. Principal bandeira do prefeito Eduardo Paes, o novo sistema de bilhetagem digital, que deveria ser o primeiro a ser licitado no país, está imerso em uma enorme confusão. As consequências podem ser desastrosas para a população, que já enfrenta sérios problemas para se locomover, aumentando o caos da mobilidade na cidade , e causando a paralisia dos transportes públicos do Rio.

Segundo o planejamento da Prefeitura, a nova bilhetagem, com início de funcionamento previsto para 2023, deveria concluir o processo de reestruturação dos transportes públicos do Rio, como um modelo a ser seguido por outras grandes cidades. Entretanto, o interminável imbróglio criado em torno da licitação do sistema tem frustrado as pretensões de Eduardo Paes.

A atual vencedora da licitação – o Consórcio Bilhete Digital – enfrenta pesados questionamentos das outras três empresas concorrentes sobre sua experiência na operação do sistema e capacidade técnica. O que causa mais estranheza é o reconhecimento de que a líder do certame ocupa este lugar amparada em documento inadequado do Detro-RJ.

Na primeira fase da licitação, o Consórcio Bilhete Digital apresentou a melhor proposta econômica, com outorga de R$ 110 milhões (apenas R$ 2 milhões acima da segunda colocada, a Tacom, com R$ 108 milhões). Entretanto, a empresa Sonda Mobility, terceira colocada, com lance de R$ 81 milhões, entrou com recurso, alegando que o consórcio vencedor não teria incluído, entre os documentos de habilitação, uma autodeclaração de veracidade das informações.

Com base nisso, a Prefeitura desclassificou o Bilhete Digital do processo. O grupo, então, acionou a Justiça, com o argumento que a exclusão seria arbitrária e pautada em mero formalismo.

O juiz André Pinto, da 16a Vara de Fazenda do TJ-RJ concedeu liminar ao Consórcio, determinando sua reintegração à licitação. Para ele, “a exigência imposta ao impetrante, na qualidade de candidato, parece um tanto arbitrária e exagerada, no sentido de cobrar uma autodeclaração da parte acerca da veracidade e autenticidade de tais documentos, que já teriam sido previamente convalidados por órgãos públicos competentes”.

Como garantia da sua capacidade técnica, a Bilhete Digital apresentou o polêmico certificado do Detro-RJ, atestando que a empresa tinha um contrato com o órgão desde 2019, na área exigida pela licitação – o sistema de bilhetagem eletrônica.

O atestado do Detro-RJ foi questionado pelos demais concorrentes e alvo de uma pesquisa sobre os contratos com a empresa. O órgão esclareceu que os serviços só foram efetivamente prestados não a partir de janeiro de 2019 e, sim, de dezembro de 2021, quase três anos depois.

Mas fica pior. O contrato entre o Consórcio e o Detro não tinha nenhuma relação com bilhetagem eletrônica. A empresa, em realidade, nunca atuou na área. Assumiria, assim, um sistema complexo sem nenhuma experiência prévia no segmento.

A situação é delicada. Estamos no período eleitoral. O Detro-Rj é controlado por Cláudio Castro, candidato à reeleição e adversário de Paes, pelo menos circunstancialmente. Para prosseguir com as diligências, a Comissão terá que confrontar o órgão, abrindo um possível conflito político. O prefeito Eduardo Paes, por sua vez, quer porque quer concluir a licitação, mas, estrategicamente, deve postergar a decisão até o fim das eleições. Paes, que considera a cassação da bilhetagem da atual operadora, a Riocard, um dos feitos da sua gestão, pode estar na condição de abrir um balaio cheio de cobras e lagartos. Trata-se de uma caixa de Pandora que a cidade  não precisava ver aberta. O que vem dentro dela pode significar um verdadeiro estado de calamidade para Rio.  Espera-se do Prefeito que nos livre de mais essa.

Editorial Estação Rio

Foto: Divulgação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

%d blogueiros gostam disto: